Elas são visitas indesejadas, mas não podemos dizer que não sabíamos que estavam vindo. Isso porque, quando chove, é quase certa a presença delas nas nossas casas. Ficam nas paredes, em torno das lâmpadas, as asas pelo chão. Em alguns lugares, são chamadas de mosquitos da chuva; noutros, de formigas de asa. Há quem as conheça como saraças, nome mais regional, usado em cidades do Interior cearense.
O certo é que, de forma genérica, são todas da classe Insecta, são formigas, e elas voam. Mas de onde elas vêm? Por que aparecem quando chove? E onde elas ficam quando não está chovendo? Vamos entender:
Pode ser qualquer uma. Quase todas as espécies de formigas podem ter asas. Estas formigas voadoras, quando as vemos com asas, pensamos se tratar de outro tipo de formiga, diferente daquelas a que estamos habituados a ver pela casa. Mas não são. São as mesmas formigas, da ordem Hymenoptera (a mesma das abelhas e dos cupins), porém em uma forma diferente de desenvolvimento.
A época das chuvas é propícia para a multiplicação de vários insetos, como a formiga, o cupim, o grilo. Nesse período, as formigas aproveitam para fundar novas colônias, isto é, para se deslocar a novos espaços. Para fundar um novo ninho, é preciso escavar a superfície escolhida, como o solo.
No entanto, durante os meses de calor, o solo acaba por ficar duro e seco. Assim, é preciso alguma umidade para amolecê-lo e permitir que as formigas cavem as fundações de sua nova colônia.
Insetos são animais sensíveis às mudanças na pressão atmosférica. Portanto, eles sabem antes de chover que a chuva está a caminho. Assim, começam a partir antes da torrente de água. Esse comportamento dá origem a um fenômeno conhecido como revoada, quando vemos uma nuvem de insetos voando pelos céus.
Com as formigas aladas, não é diferente. Elas sentem a aproximação da chuva e preparam uma revoada para fundar novas colônias. Este deslocamento, no entanto, não tem apenas uma função territorial, mas também um interesse reprodutivo.
“Quando a gente vê essas formigas voando com asas, ali tem machos e fêmeas para acasalar. Elas voam por algumas centenas de metros de altura. Esse voo é chamado de voo nupcial”, explica o professor do curso de Agronomia da Universidade Federal do Ceará, Wagner Melo, especializado em entomologia, o estudo dos insetos.
“As revoadas precisam anteceder o período da chuva, mas elas se prolongam até o final da estação chuvosa”, detalha o docente. Por isso, ao longo do período chuvoso, é comum ver estas formigas de asa, o que torna a época uma espécie de “temporada” de acasalamento e reprodução.
Antes do início das chuvas, estes insetos preparam-se para o evento de dispersão. Quase todas as espécies de formigas, inclusive as que temos em casa, podem ter asas. Mas, em uma colônia, nem todos os indivíduos desenvolvem asas. Há indivíduos que nunca vão ter asas, porque não são dispersantes (não vão ajudar a fundar novas colônias).
Formigas passam por um desenvolvimento completo: ovo, larva, pupa e adulto. Os indivíduos dispersantes, que vão voar e fundar novas colônias, desenvolvem asas na fase de pupa. Majoritariamente, apenas machos e rainhas têm asas. Portanto, aquela nuvem de formigas voadoras que aparece nas lâmpadas, paredes e piso das casas é composta, basicamente, de machos e rainhas a procura de acasalar e partir para fundar novas colônias.
“O macho só tem energia para sobreviver algumas semanas. Já a fêmea [a futura rainha] tem energia para copular, cair no solo, tirar as próprias asas e fundar uma nova colônia”, descreve Wagner Melo, “essa rainha já tem esperma, porque ela copulou com o macho, e vai colocar ovos. Um tipo de ovos ela vai comer para ter energia, outro vai ser o primeiro grupo de operárias. Essas operárias vão começar a abrir o ninho”, isto é, a construir a nova colônia.
Apesar desta dieta de ovos da rainha no período seminal da fundação da colônia, a alimentação das formigas é baseada, na verdade, em fungos. É comum pensar que elas comem folhas de vegetais, que as vemos carregar por aí. Contudo, a formiga não se alimenta da folha, ela utiliza a folha para multiplicar os fungos dos quais se alimenta.
Antes de acasalar, as formigas se alimentam dos fungos, ou seja, vão para a cópula com o fungo no intestino. Após a fecundação e a queda no solo, a fêmea escava o espaço da nova colônia, onde vai pôr ovos, e regurgita o fungo que tem no intestino.
Assim, no novo espaço, ela começa a “semear” os fungos que são a base da alimentação da colônia, inclusive das primeiras operárias, que vão se alimentar deles e, posteriormente, ir em busca de folhas que ajudem a reprodução destes fungos.
“É comum ver muitas formigas aladas voando. 98 a 95% dessas formigas que voam são comidas por alguns vertebrados e invertebrados, insetos e pássaros. No máximo 5% vão fundar novos formigueiros”, esclarece o professor especializado em entomologia.
Além da ingestão das formigas por outros animais, há outros obstáculos, encontrados dentro das casas, que acabam por aumentar a mortalidade destes insetos. Um deles é a lâmpada.
“Esses insetos respondem positivamente à luz. Normalmente eles utilizam a luz para se guiar. Ela fica girando em torno da luz [da lâmpada] e vai morrer porque não vai encontrar seu destino”, exemplifica Melo. Enquanto estão no entorno da luz, as formigas podem até cumprir a missão do acasalamento, mas acabam por não sair dali e morrem: “É simplesmente uma desorientação, ela gasta muito energia”.
Como elas precisam de um pouco de umidade para a fundação das novas colônias, casas com lixo acumulado ou cantos com acúmulo de água podem ser vetores de atração destes insetos. Além disso, como são fotossensíveis, as luzes da casa acabam por atraí-los. Por fim, o excesso de umidade é prejudicial, assim, um abrigo – como a casa – é bem-vindo.
A despeito da invasão destas visitas indesejadas, Wagner Melo esclarece que elas não representam perigo: “De forma alguma. O único perigo seria uma picada ou algo assim. Evidentemente, se você tivesse uma alergia a ácido fórmico, poderia desencadear uma reação. Mas é raro, apenas 1, 2% da população”.
Para quem quer se livrar delas, a solução pode ser caseira também. “Para controlar é só espalhar um pouco de limão com cravo na casa”, revela o docente.
“Quando não está no período de chuva, normalmente elas estão em seus abrigos e ninhos. Pode ser no jardim, no solo, tem formigas que fazem ninho em árvore. Em períodos frios, é comum ver formigas dentro de impressores, de tvs, ambientes que geram calor. Mas normalmente estão no solo próximo a árvores”, conclui o especialista.
Fonte: APRAG